segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Volta às aulas Stephen Kanitz


            "O estudante de hoje deve concentrar-se em uma das competências mais importantes para o mundo moderno: aprender a pensar e a tomar decisões”.
            Jamais esquecerei o meu primeiro dia de aula na Harvard Business School. No dia anterior recebemos noventa páginas descrevendo três problemas administrativos que haviam ocorrido anos atrás em empresas verdadeiras. Tínhamos 24 horas para tomar uma série de decisões, utilizando as mesmas informações disponíveis à diretoria da época. Eram um problema por matéria e três matérias por dia.
            O primeiro caso do dia tratava de uma empresa controlada por dois irmãos, bem-sucedida por trinta anos, até o dia em que um deles se desquitou e casou com uma moça vinte anos mais jovem. Esse pequeno fato desencadeou uma série de problemas que afetavam o desempenho da empresa. Nós éramos os consultores que teriam de sugerir uma saída. No primeiro dia, na primeira aula, o professor entrou na sala e simplesmente disse:
            – Senhor Kanitz, qual é a sua recomendação para esse caso?
            – Por que eu?
            As aulas a que eu estava acostumado em toda a minha vida de estudante consistiam num “bando” de alunos ouvindo pacientemente um professor que dominava as nossas atenções pelo resto do dia. Simplesmente, naquele fatídico dia, eu não estava preparado, quando todos voltaram suas atenções para mim – e, pelo jeito, eu é que teria de dar a aula.
            Esse sistema é conhecido por ensino centrado no aluno, e não no professor. Tanto é que minha grande frustração foi ter os melhores professores de administração do mundo, mas que ficavam na maioria das aulas simplesmente calados. Curiosamente, falar em aula era uma obrigação, e não o que em geral acontece em muitas escolas brasileiras, em que essa atitude é passível de punição.
            Outra descoberta chocante foi constatar que a maioria dos famosos livros de administração de nada servia para resolver aquele caso. Nenhum capítulo de Michael Porter trata especificamente de "problemas de desquites em empresas familiares", um fato mais comum nas empresas do que se imagina. A maioria das decisões na vida é de problemas que ninguém teve de enfrentar antes, e sem literatura preestabelecida. Estamos sozinhos no mundo com nossos problemas pessoais e empresariais. Quão mais fácil foi a minha vida de estudante no Brasil, quando a obrigação acadêmica era decorar as teorias do passado, de Keynes, Adam Smith e Peter Drucker, como se fossem livros de auto-ajuda para os problemas do futuro.
            Durante dois anos, estudamos mais de 1.000 casos ou problemas dos mais variados tipos: desde desquites, brigas entre o departamento de marketing e o financeiro, greves, governos incompetentes, fusões, cisões, falências até crises na Ásia. Isso nos obrigava a observar e destilar as informações relevantes, ignorar as irrelevantes, ponderar as contradições, trabalhar com vinte variáveis ao mesmo tempo, testar alternativas, formar uma decisão e expô-la de forma clara e coerente.
            Estavam ensinando por meio de uma metodologia inédita na época (1972), o que poucas escolas e faculdades fazem até hoje: ensinar a pensar. Em nada adianta ficar ensinando como outros grandes cérebros do passado pensavam. Em nada adianta copiar soluções do passado e achar que elas se aplicam ao presente. Num mundo cada vez mais mutável, em que as inter-relações nunca são as mesmas, ensinar fatos e teorias será de pouca utilidade para o administrador ou economista de hoje.
            Ensinar a pensar também não é tão fácil assim. Não é um curso de lógica nem uma questão de formar uma visão crítica do mundo, achando que isso resolve a questão. Sair criticando o mundo, contestando as teorias do passado forma uma geração de contestadores que nada constrói ou nada sugere.
            Minha recomendação ao estudante de hoje é para que se concentre em uma das competências mais importantes para o mundo moderno: aprender a pensar e a tomar decisões.

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