quinta-feira, 3 de março de 2016

Quem sou eu

O Educador como Pessoa



Contam os historiadores da Filosofia que no frontispício do templo de Apolo, em Delphos, estava escrito: “Conhece-te a ti mesmo”. Este foi e continua sendo o ponto de partida todas as vezes que buscamos nos confrontar conosco mesmos à procura da nossa identidade, ou seja, daquilo que nos torna únicos, daquilo que nos faz ser que somos.

Milton Nascimento imortalizou essa busca nos versos de uma linda canção: “Eu, caçador de mim”. Onde, porém, devemos começar essa “caça” de nossa identidade? Será que devemos melhorar em nosso próprio interior e perscrutar os abismos da alma? Creio, sinceramente, que não é preciso tanto. Há outro meio mais simples e objetivo de realizarmos essa tarefa.

Jean Paul Sartre, o mais famoso filósofo francês do pós-guerra, cunhou uma sentença lapidar a respeito desta questão: “o homem é aquilo que ele faz”. Portanto, em vez de mergulhar nos abismos da alma, pense um pouco em sua na sua vida, na sua trajetória, nos caminhos que você percorreu para chegar até aqui. Procure lembrar-se de tudo o que foi mais importante, mais significativo para a sua vida, aquilo que mais contribuiu para que você seja o que é hoje.

Apenas para ajudar em seu itinerário, é interessante lembrar uma das bases do paradigma do desenvolvimento humano, que pode ser resumida assim: “Aquilo que uma pessoa se torna ao longo da vida depende fundamentalmente de duas coisas: das oportunidades que teve e das escolhas que fez”. De fato, se pensarmos bem, cada um de nós é fruto das oportunidades que tivemos e das escolhas que fomos fazendo ao longo da vida. E algumas escolhas são determinantes em nossa trajetória pessoal. Como a escolha daquela ou daquele com quem vamos compartilhar nossa vida ou a escolha da profissão que vamos seguir.

Fazer escolhas, tomar decisões, definir o rumo de nossa própria existência, é o que faz o homem, no dizer de Erich Fromm, “o parteiro de si mesmo”, isto é, as nossas decisões na vida e as ações delas decorrentes é que nos fazem ser o que somos.

Muitas vezes, porém, quando a gente se debruça sobre este tema e se faz estas indagações, temos a tendência de ficar procurando os responsáveis pelo aquilo que aconteceu ou deixou de acontecer em nossas vidas. É sempre mais fácil a gente responsabilizar alguma pessoa ou circunstância e, assim, tirar a responsabilidade de cima de nossos ombros e colocá-las no de outras pessoas. Esta é uma tentação muito freqüente, não só hoje, mas em todos os tempos. Não é verdade?

É o mesmo Sartre, no entanto, que nos dá uma orientação precisa a esse respeito, quando afirma: “O importante não é o que fizeram de nós, mas o que nós próprios faremos com aquilo que fizeram de nós”. Quando a gente olha o nosso passado, o nosso presente e as nossas opções futuras por esta ótica, as coisas assumem outra forma e a vida parece nos dizer: Vai nessa! A bola é sua! Assuma a condução do seu próprio destino! O melhor lugar é aqui. A melhor hora é agora. Comece com aquilo que você já sabe, construa sobre aquilo que você já tem. Não deixe passar a flor do mundo que, a cada manhã, desabrocha em nossas vidas. Colha-a!

É muito importante que a gente se compreenda e se aceite como realmente é. Sem isso, não podemos falar de identidade, que é a continuação de nossa personalidade, daquilo que nos faz únicos e irrepetíveis, no tempo. É a clareza a cerca de nossa identidade que nos permite mudar sem deixar de ser a gente mesmo. Sem deixar de ser aquilo que se é.

É muito importante, professor ou professora, no início de nossa caminhada ao longo do trajeto contido neste livro, que você pare um pouco e pense em si mesmo como pessoa, como indivíduo, como ser humano que ocupa lugar neste mundo. Alguém, que tem uma história de vida, alguém que, neste momento, está confrontado com um conjunto de situações em sua existência e, sobretudo, alguém que tem ideais, projetos, sonhos e esperanças.

Portanto, pare um pouco, e se pergunte: quem sou eu? Responder claramente a esta pergunta é sempre um importante primeiro passo no caminho de mudança em nossas vidas. E é por aí que pretendemos começar a construção de um novo caminho na sua trajetória de educador. Não podemos mudar, porém, a nossa atitude básica diante do nosso trabalho se, antes, não formos capazes de mudar nossa atitude básica diante da vida. Por isso, decidimos começar pelo começo de tudo, que é a sua relação consigo mesmo.

Extraído do Capítulo 1 do livro O Professor Como Educador, de Antônio Carlos Gomes da Costa.

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